Sunday, November 23, 2008

Derrocada

Nada pode ser tão destrutivo para um ser humano como adquirir uma consciência leviana da sua importância para a humanidade. Quando um homem se proclama um gênio para si mesmo, não para os outros (palavras, palavras, apenas palavras), ele dá início inevitável a uma derrocada espiritual giganteca.

Vejo a cada dia meu amigo Páris se perder em auto-suficiência e quantidades expressivas de álcool. Não se esvai apenas seu dinheiro, mas sua razão escorre pelos goles intermináveis de cerveja. Não crio a imagem hipócrita de negar o sabor e prazer do álcool, mas há um tênue (porém representativo) limite entre o mero consumo e a dependência de uma droga que altera o estado de cosnciência de uma pessoa.

Vejo meu amigo se perder em sua própria amargura, encontrando a resposta mais fácil e mais terrena. Qual a genialidade disto? Um pintor que não mais pinta. Um poeta que não mais busca o sentimento profundo. Um rato que se contenta com o raso. Um ser humano diferenciado que busca avidamente ser igual, que não suporta o que é e o que pode ser.

E minha mãe tem razão. São os filhos dela capazes de enfrentar o óbvio com as críticas que constróem como seres pensadores que são. Então me afasto. Não há amizade que pague pela desistência de ser absoluto, verdadeiro e melhor.

Tuesday, November 18, 2008

Um alvorecer

Acaba de surgir alto no céu o sol, decretando minha primeira real virada de noite européia. Não, não foi regada a álcool ou festas descabidas em um dia aleatório da semana, mas embasado no chato e velho estudo e compromissos acadêmicos que por alguma razão me motivam tanto.

Há um quê de diversão nesta vida de doutorando. Meu trabalho basicamente é o estudo e a geração initerrupta de idéias passíveis de mudar os rumos da humanidade. E isso de forma alguma me exige um compromisso com horários (exceto pelas minhas aulas que correspondem a 5% do meu tempo de dedicação efetiva). Assim, hoje decido dormir após as 8h da manhã para um despertar pós meio-dia seguido de mais estudo e ida para a universidade. Me parece uma vida bacana esta de morar na Espanha estando plenamente adaptado ao fuso horário da Califórnia. Whatever, nonsense.

Semana que vem tô indo pra Londres em uma data singela de folga incomum nas atividades estudantis e aproveitando os vôos baratos de companhias aéreas de qualidade duvidosa. Who cares? I'm going to bloody britain, lad!

Monday, November 17, 2008

Ser diferente é tão igual

Esperam que sejamos tantos e no final das contas nos tornamos nenhum

Apenas a sombra de um reflexo

Em um espelho que a gente não vê

O único

Vemos tudo

Vemos demais

Mas nesse exagero de personalidades

Nesta necessidade de ser todas as peças de um quebra-cabeça

Perdemos o muito que nos foi dado

Esquecemos o que mais merecia ser lembrado

Nos tornamos os vencedores de uma disputa inexistente

Enfim, nos divorciamos da nossa essência

Saturday, November 15, 2008

Da série Poemas Fajutos

how can happiness be so sad?
how can yesterday be so far away?
how can tomorrow be so impossible?

but sadness can also be happy
and yesterday may be in our hearts
and the impossible can become the truth

Four seasons
and spring is the one i like the most
because it reminds me of rebirth
that nothing is lost, it may just be hidden somewhere

so search
with your heart
be irrational for it may make you human
be human for it may make you love
and love
with all your strength
with all you got
cause in the end
all you got
anyway
is love

Saturday, November 8, 2008

Um novo estado de espírito - uma retrospectiva da quinta semana

Esta é uma micro-história que começa pelo fim, porque assim me parece mais interessante.

SEXTA-FEIRA

Festa de lançamento da Record Espanha aqui na Casa do Brasil. TV de pobre é foda: cartazes colados na parede, caipirinha, guaraná, vinho barato e João Kléber (sim, ele estava aqui). Tomei uma caipirinha e me atraquei no guaraná, o que despertou surpresa em olhos alheios. Não estava em um estado de espírito de me embriagar o mínimo que fosse e apenas cuidei de me empanturrar com os quitutes de padaria oferecidos na mesa (me pareceu justo).

Aí vou pra fora com o intuito de degustar um cigarro e não mais. O Páris vem junto e mais o cara mais desagradável do mundo.

PARÊNTESES - O CARA MAIS DESAGRADÁVEL DO MUNDO

Deve ter uns 55 a 60 anos. Nenhum laço familiar e psicólogo de origem com mestrado em sei lá o quê e doutorado em sei lá das quantas tirado na Unisinos. Se sentindo diminuído por ter estudado em São Leopoldo argumenta que foi um doutorado de excelência criado pela instituição e que ele foi formalmente convidado a se juntar ao corpo docente (tá, negão, e daí?). Me pergunta como eu me sinto morando sozinho e eu digo que já faz algum tempo que eu moro praticamente sozinho e ele começa a me questionar se há um motivo para isso, buscando analisar minha relação com meus pais e família, acho. Eu deveria ter respondido que faço isso porque eu sou a única pessoa que eu considero suportável de se conviver, o que não seria verdade mas daria algo pra ele ocupar a cabeça. De qualquer forma, linhas demais para uma pessoa tão desimportante.

FIM DO PARÊNTESES - DE VOLTA A SEXTA-FEIRA

Ah, sim, mais cedo o Páris havia recebido uma mensagem da Gabriela dizendo que ela queria se encontrar com ele pela noite (a origem desta história remete a quarta e quinta-feiras). Buenas, ela chega e meio que arrasta ele para o quarto antes de qualquer movimento socialmente necessário e de lá só saem pelas 3 da manhã (ela chegou umas 10 e meia). Durante este interregno eu vejo uns idiotas (entre eles o cara mais desagradável do mundo) roubarem vinho escondido da festa da Record que já terminara e da qual os pertences estavam sendo realmente distribuídos (qual o sentido em esconder, então?), volto pro quarto e demoro 40 minutos pra mandar um e-mail pra biblioteca da UFRGS com a minha dissertação e desço novamente para o lobby, ainda que sem muita vontade, para interagir com a galerinha, manja?

Ao menos tava o André lá, que é um dos caras mais decentes de se conversar nesse país, apesar do palmeirismo do paulista. Ao menos ele tem gosto pela auto-depreciação apesar de sempre aparecer aqui com uma mina mais gostosa que a anterior. Aí chega um gênio duma morena escultural potiguar e me critica pra dizer que eu só abro a boca pra falar de mulher e que minha cabeça devia ser muito oca. Aí eu rebato com o clássico:

- Olha, baby, então me diz o que você pensa da conjuntura político-econômica internacional em face do crescente número de blocos continentais, considerando a questão da soberania das nações.

Olha, eu sei espantar uma gostosa como poucos antes já souberam. Anyway, ainda discuti com ela depois ao afirmar que, para mim, o Cazuza era um bostinha que só ficou marcado para a história de um país culturalmente subdesenvolvido porque foi uma figura pública que assumiu ser portador do vírus aquele. Ah pára, tchê, vem chamar o cara de "poeta contemporâneo".

Minha noite de sexta foi basicamente este lixo. Mas as noites anteriores, como irá de se ver, não foram muito melhores não.


QUINTA-FEIRA

Eu não tava nem um pouco a fim de sair e nem estou muito a fim de contar como que foi, então breve serei. O Páris queria porque queria ir no De Cine ver a Gabriela e usou o velho argumento de que era o dia de Barra Libre (chope liberado a 5 euros e que acabou nos saindo por 0 - como é bom ser amigo de quem manda). Fomos, o vazio bar de todos os dias estava abarrotado de espanhóis barulhentos, a música era ruim pela primeira vez em tal ambiente e conseguir um chope que fosse era quase uma questão de honra. O melhor que pôde ser feito foi o Páris ter feito um desenho da Gabi eter dado pra ela que ficou toda ui ui ui ai ai ai e esses monossílabos que são capazes de resumir praticamnte qualquer sentimento afetivo feminino (OPAH!).

Tá, o bar esvaziou e eu xinguei muito o cara com nome de capital de país europeu para que fôssemos embora ao que tive êxito depois de um tempo mais dilatado do que seria do meu gosto. Ainda tenho que aguentar todo o caminho de volta com aquele grego/brasileiro/francês/espanhol perguntando se a guria gostava dele. Eu queria acreditar em alguma peça ficcional e pedir a ela que me desse paciência. Maldito niilismo que me deixa sem nenhum alento.


QUARTA-FEIRA

Recebi minha carta de alforria universitária semanal com uma hora de antecedência, dado que o professor estava sofrendo de algum tipo de enfermidade e precisava dirigir-se ao médico. Saímos, então, Páris, Stéfano e eu. Fomos no De Cine (sempre) e estava vazio, ao que ficamos bebendo a cerveja mais barata do oeste europeu e conversando com a Gabriela, argentina que está substituindo a basca, que é bem gata e que tem um namorado também argentino e que trabalha de promoter (adoro palavras em inglês que fazem um argentino pé-de-chinelo parecer mais do que um otário que fica na rua chamando pessoas pro bar) e mora com ela. Mas ele não trabalhava naquela noite e num momento totalmente bizarro o Páris ASSUME que tem muito sex appeal. O que eu posso comentar disso? Comentar meu ataque histérico de risadas? Comentar que ele ficou puto por eu ter tido tal surto? Nah, vou comentar que a partir deste momento a argentina vagabunda começou a pegar na mão dele e olhar pra figura como se olhasse para o príncipe encantado que a iria retirar daquele esgoto imundo que era sua vida.

Buenas, ele chegou até a entrar dentro do balcão pra tentar agarrar ela, mas ele declinou justificando que haviam ali colegas do seu namorado. Esses idiotas argentinos ainda convidam nós 3 para uma festa ARGENTINA à qual eu não tinha o menor intento de ir, mas, ora, foda-se. Fomos e a Gabriela segue seu caminho não-festivo rumo à casa do namorado. Com muito tato e convencimento faço o idiota do Páris acreditar que era uma boa IR ATRÁS DELA. Nisso vamos eu, o Stéfano e mais dois argentinos de la concha sus madres pra PIOR FESTA QUE EU JÁ FUI NA MINHA VIDA e onde somos interpelados por um anão bêbado que nos achou tão legais que insistia em nos apresentar mulheres. O problema era que ele não conhecia nenhum e todas que ele se aproximava não só se afastavam como IAM EMBORA DA FESTA. Justo. Ainda discuto com um argentino no banheiro porque ele ficou magoado de eu ter em algum momento dito "argentinos de merda". Ainda me pergunto como ele entendeu se eu falei em português.....

No final das contas o Páris chega em casa meia hora depois de mim e ele tinha de fato pegado a argentina libidinosa. É sempre bom fuder com a vida de um porteño (no caso o namorado dela) mesmo que seja através de outros.

E essa foi minha quinta semana em Madrid, ou ao menos os fatos mais relevantes e passíveis de publicação. Uma merda, eu sei, vou começar a partir para a ficção e, assim, fazê-los crer que a minha vida é mais bacana do que realmente é.

Tuesday, November 4, 2008

O espelho

Cá estou no trem que me leva de Madrid à universidade em Cantoblanco. À minha frente um pai e sua filha com síndrome de down. Olho para ela e vejo toda a essência que me falta, que me foi perdida. A pureza regida pela mente incapaz de se auto-torturar constantemente. Poderia sentir o mesmo pelos ignorantes ou preguiçosos cerebrais em geral, mas por estes o que me desperta é o mero desprezo. E na debilidade desta menina vejo minha alma refletida ao avesso.

Sunday, November 2, 2008

La Tortuga

Eu não vou fornecer nenhum contexto pro que se passa, fazendo parecer apenas uma psicodelia total.

Cenário: Táxi, Paseo do Prado e encaminhamento para Moncloa.

Personagens:

Páris: Bêbado
Taxista: Assustado
Bruno: Rindo e sem nenhuma outra contribuição em especial.

Páris: Sabes (dirigindo-se ao taxista), tengo un amigo brasileño que es muy raro. Me lo crees que tiene una tortuga marina viviendo en su habitación?

Bruno: Muahahahahahahaha

Taxista: ?(arquejar de sobrancelhas)

Páris: Si, una tortuga gigante de dos toneladas. Es del tamaño de este coche. Y crees que mi amigo hasta la he comprado unas gafas y la llama su novia?

Taxista: Del tamaño del coche?

Páris: Si, y ella vino con él por avión.

Taxista: Pero la legislación para animales extranjeros está muy rígida, hombre.

Páris: Lo sé, lo sé.

Bruno. BUAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA.

Taxista: Cá estamos en Moncloa.

Páris: Vale, vale. Buenas noches.

Bruno: Hijo de puta que me va hacerlo pagar, po!